Deixar
uma realidade ilusória cair
Dói,
mesmo quando essa realidade era perturbadora.
Dá-se
uma morte que deveria proporcionar um alívio.
Mas
onde está ele?
Tudo
em mim é substância de alma em pedaços
Que
se colam e descolam consoante
A
coloração dos meus climas internos
A
minha sensação de mais ou menos esperança
O
meu confronto interno, adiado ad eternum
Alfinetado
com conflitos internos, também eles, permanentes.
Camadas
de conflitos integrados como parte de uma identidade.
A
minha rendição à vítima que, sim,
Fui
e ainda sou
Por
menos bonito que isto possa parecer.
Tudo
em mim é um ir e vir sazonal
É
um querer que o tempo passe,
É
um riscar os dias no calendário
Não
sei bem para quê ou porquê.
Não
sei bem para que quero que o tempo passe ou onde quero chegar
Quando
lá chego, não sei bem onde, existe, outra vez, este abismo.
E
tudo em mim são máscaras por cima de camadas por cima de traumas
Por
cima de desculpas e justificações
Por
cima de auto-dúvidas da minha própria sanidade mental
Num
discurso interno alimentado por vozes alheias
Sólido,
demasiado sólido, demasiado difícil de penetrar, de destruir
Uma
criança inoportuna, indesejada, manipulada
Fruto
de esquecimento, antes e depois de existir
Reflexos
inadvertidos de realidades que nunca deveriam ter ocorrido
Mas
que agora se repetem, sem querer.
Com
a consciência lancinante de que estou a perpetuar, mesmo sem querer
Padrões
tóxicos, culpas, vergonhas.
Sem
querer eu sou tudo isso, e sem querer também,
Decidiu
alguém dar-me esta função e este papel
Doloroso,
sombrio, de alterar.
Por
isso, sim.
O
cair de uma realidade, por mais perturbadora que fosse
Era
como a conhecíamos.
E
afinal, não é suposto ser assim?
É
possível viver sem a permanente sensação de que algo não bate certo?
É
possível que o desassossego interno não seja tão negativo?
Afinal,
não era só tudo da minha cabeça
Que
não, não era suposto ser assim?
É
toda uma identidade que está em jogo.
Mesmo
que essa identidade oscile entre picos de
Isto
faz tanto sentido, isto é tão certo, isto é tão intuitivo, nunca fui tão feliz,
olha toda esta magia, olha toda esta wonderland, olha toda
esta maravilhosidade que é tudo, olha que extase, isto é a
vida, é extase, olha esta essência, olha que beleza, simplicidade, gratidão,
amor por viver
E picos
de sentir que nunca nada valeu, não vale nem nunca irá valer
Absolutamente
nada.
É
esmagador e não dá para "simplesmente ignorar" quando está a gritar
pela minha atenção.
12052023
Hoje... eu amo o conhecido e o anónimo, o singularmente comum, o mais
comum do essencial, o mais louco do desconhecido
Ontem lembrei-me de ir revisitar o meu livro de poemas, escrito há uns
bons anos, e foi como se tivesse revisitado a Cláudia que escreveu esta frase.
Na realidade, o que tenho feito é muito disto: revisitar pessoas que já fui,
mas que ao ler (ainda bem que vou deixando sempre registado) ainda muitas
coisas ressoam em mim hoje em dia, apesar de ilusoriamente achar que já
ultrapassei muita coisa. Lembro-me perfeitamente das preocupações que tinha
nesta altura e exatamente o que me levou a escrever isto; é muito subtil. As
sensações, de vez em quando ainda me visitam, e são antigas. E, seguindo a
recomendação de uma amiga, tenho-me perguntado que idade têm as emoções que
sinto: efetivamente algumas delas são mesmo muito antigas.
Este "chamado" que tive este ano, como
uma voz interior que me disse "andas adormecida na vida, acorda porque
tens coisas para resolver" trouxe-me a esta desconstrução e
mudança de pele que estou a viver. E ao revisitar outras
transmutações pessoais que já vivi, apercebo-me de que as emoções que sinto
hoje, muitas delas são antigas, mas eu não tinha o vocabulário para as
descrever ou para as trabalhar. Coisas como cura, trauma, amor próprio,
limites, espiritualidade, entreter ideias, narrativas internas, entre
outros conceitos.
Tenho também - e estou em pura fase de
construir - mais ferramentas internas para lidar com os meus desafios.
Descobri que afinal não há porque me sentir sozinha nas minhas dores, porque eu
realmente tendia a viver isto de forma muito solitária. E embora fosse
uma solidão voluntária, porque acho que é essencial
escutar o nosso próprio silêncio, porque ele comunica connosco, mesmo que
não queiramos ouvir, ou que ignoremos as respostas ou as indicações como eu
tantas vezes fiz e tenho vindo a dizer, como tenho muita dessa solidão era
porque acreditava que mais ninguém se havia de sentir como eu, porque são
sempre coisas tão específicas.
Apercebi-me realmente do quão cega andava,
apesar de já achar que me explorava bastante a mim própria em termos de
evolução pessoal, fui resolvendo coisas ao longo do caminho mas acho
que nunca tinha ido tão a fundo como agora. As recentes realizações de
várias coisas, desde o facto de que o meu amor próprio estava tão em baixo que
me deixava rebaixar deliberadamente por pessoas que me deviam amar
incondicionalmente, deixar que me dissessem - e pior, acreditar nisso - que sou
sensível por ter emoções fortes, que os problemas relacionais que tenho são
exclusivamente por culpa minha, aliás que tudo é culpa minha; por me negar a
viver a vida como quero, como sinto que a devo viver, ignorar por completo a
minha intuição aos mais variados níveis, e por ceder quase sempre ao que os
outros queriam ou achavam melhor, à minha incrível dificuldade para expressar a
minha voz e estabelecer os meus limites, às limitações que eu não imponho tanto
aos outros mas imponho tanto a mim mesma, entre tantas outras "pequenas"
coisas. É difícil e doloroso trabalhar nisto, mas sinto, agora mais do
que nunca, que é necessário. Mais do que nunca, porque tenho de ser um
exemplo para a minha filha, não posso querer que ela seja no futuro uma pessoa
emocionalmente forte, com autoestima, com amor próprio, se a própria mãe tantas
vezes e de forma tão subtil disse "não" a si mesma e sim para os
outros. Estou, agora sim, a começar a dizer SIM a mim mesma. Sem achar
constantemente que há algo de errado em ser quem sou!
Tenho estado, mais do que nunca, na
minha bolha. Alguns dias é-me difícil viver no mundo real, ter de lidar com
assuntos mundanos ou aderir a conversas que no fundo não me interessam, só por
pertença a grupos sociais, fazer coisas por obrigação. Claro que tenho de as
fazer. Não sou uma ilha, não vivo sozinha, preciso funcionar em sociedade,
preciso vestir essa persona todos os dias. Mas há dias em que
isso me é mesmo muito difícil. Só queria ser essência o tempo todo, só
queria ser, sem ser em esforço. Há dias em que só queria
ficar em retiro durante um mês seguido! Não ter de lidar com a(s)
realidade(s) externas enquanto reorganizo e reconstruo as minhas internas.
No outro dia, tive um dia energeticamente tão
pesado que desabei a chorar mal cheguei a casa e nem sabia bem porquê, mas sabe
tão bem chorar. E é tão necessário.
Estou a transmutar e a ressignificar mais coisas
do que as que consigo alguma vez descrever por palavras. Poderia dizer tanto
mais, mas fico-me por aqui por hoje. Faz-me bem escrever isto.
Em
"Mulheres que Correm com os Lobos" de Clarissa Pinkola
Estes
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