domingo, 4 de agosto de 2024

15052023

 

Deixar uma realidade ilusória cair

Dói, mesmo quando essa realidade era perturbadora.

Dá-se uma morte que deveria proporcionar um alívio.

Mas onde está ele?

Tudo em mim é substância de alma em pedaços

Que se colam e descolam consoante

A coloração dos meus climas internos

A minha sensação de mais ou menos esperança

O meu confronto interno, adiado ad eternum

Alfinetado com conflitos internos, também eles, permanentes.

Camadas de conflitos integrados como parte de uma identidade.

A minha rendição à vítima que, sim,

Fui e ainda sou

Por menos bonito que isto possa parecer.

 

Tudo em mim é um ir e vir sazonal

É um querer que o tempo passe,

É um riscar os dias no calendário

Não sei bem para quê ou porquê.

Não sei bem para que quero que o tempo passe ou onde quero chegar

Quando lá chego, não sei bem onde, existe, outra vez, este abismo.

 

E tudo em mim são máscaras por cima de camadas por cima de traumas

Por cima de desculpas e justificações

Por cima de auto-dúvidas da minha própria sanidade mental

Num discurso interno alimentado por vozes alheias

Sólido, demasiado sólido, demasiado difícil de penetrar, de destruir

Uma criança inoportuna, indesejada, manipulada

Fruto de esquecimento, antes e depois de existir

Reflexos inadvertidos de realidades que nunca deveriam ter ocorrido

Mas que agora se repetem, sem querer.

Com a consciência lancinante de que estou a perpetuar, mesmo sem querer

Padrões tóxicos, culpas, vergonhas.

Sem querer eu sou tudo isso, e sem querer também,

Decidiu alguém dar-me esta função e este papel

Doloroso, sombrio, de alterar.

 

Por isso, sim.

O cair de uma realidade, por mais perturbadora que fosse

Era como a conhecíamos.

E afinal, não é suposto ser assim?

É possível viver sem a permanente sensação de que algo não bate certo?

É possível que o desassossego interno não seja tão negativo?

Afinal, não era só tudo da minha cabeça

Que não, não era suposto ser assim?

 

É toda uma identidade que está em jogo.

Mesmo que essa identidade oscile entre picos de 

Isto faz tanto sentido, isto é tão certo, isto é tão intuitivo, nunca fui tão feliz, olha toda esta magia, olha toda esta wonderland, olha toda esta maravilhosidade que é tudo, olha que extase, isto é a vida, é extase, olha esta essência, olha que beleza, simplicidade, gratidão, amor por viver

E picos de sentir que nunca nada valeu, não vale nem nunca irá valer

Absolutamente nada.

 

É esmagador e não dá para "simplesmente ignorar" quando está a gritar pela minha atenção.

 

 

12052023

 

Hoje... eu amo o conhecido e o anónimo, o singularmente comum, o mais comum do essencial, o mais louco do desconhecido


 

Ontem lembrei-me de ir revisitar o meu livro de poemas, escrito há uns bons anos, e foi como se tivesse revisitado a Cláudia que escreveu esta frase. Na realidade, o que tenho feito é muito disto: revisitar pessoas que já fui, mas que ao ler (ainda bem que vou deixando sempre registado) ainda muitas coisas ressoam em mim hoje em dia, apesar de ilusoriamente achar que já ultrapassei muita coisa. Lembro-me perfeitamente das preocupações que tinha nesta altura e exatamente o que me levou a escrever isto; é muito subtil. As sensações, de vez em quando ainda me visitam, e são antigas. E, seguindo a recomendação de uma amiga, tenho-me perguntado que idade têm as emoções que sinto: efetivamente algumas delas são mesmo muito antigas.

 

Este "chamado" que tive este ano, como uma voz interior que me disse "andas adormecida na vida, acorda porque tens coisas para resolver" trouxe-me a esta desconstrução e mudança de pele que estou a viver. E ao revisitar outras transmutações pessoais que já vivi, apercebo-me de que as emoções que sinto hoje, muitas delas são antigas, mas eu não tinha o vocabulário para as descrever ou para as trabalhar. Coisas como cura, trauma, amor próprio, limitesespiritualidade, entreter ideias, narrativas internas, entre outros conceitos.

 

Tenho também - e estou em pura fase de construir - mais ferramentas internas para lidar com os meus desafios. Descobri que afinal não há porque me sentir sozinha nas minhas dores, porque eu realmente tendia a viver isto de forma muito solitária. E embora fosse uma solidão voluntária, porque acho que é essencial escutar o nosso próprio silêncio, porque ele comunica connosco, mesmo que não queiramos ouvir, ou que ignoremos as respostas ou as indicações como eu tantas vezes fiz e tenho vindo a dizer, como tenho muita dessa solidão era porque acreditava que mais ninguém se havia de sentir como eu, porque são sempre coisas tão específicas.

 

Apercebi-me realmente do quão cega andava, apesar de já achar que me explorava bastante a mim própria em termos de evolução pessoal, fui resolvendo coisas ao longo do caminho mas acho que nunca tinha ido tão a fundo como agora. As recentes realizações de várias coisas, desde o facto de que o meu amor próprio estava tão em baixo que me deixava rebaixar deliberadamente por pessoas que me deviam amar incondicionalmente, deixar que me dissessem - e pior, acreditar nisso - que sou sensível por ter emoções fortes, que os problemas relacionais que tenho são exclusivamente por culpa minha, aliás que tudo é culpa minha; por me negar a viver a vida como quero, como sinto que a devo viver, ignorar por completo a minha intuição aos mais variados níveis, e por ceder quase sempre ao que os outros queriam ou achavam melhor, à minha incrível dificuldade para expressar a minha voz e estabelecer os meus limites, às limitações que eu não imponho tanto aos outros mas imponho tanto a mim mesma, entre tantas outras "pequenas" coisas. É difícil e doloroso trabalhar nisto, mas sinto, agora mais do que nunca, que é necessário. Mais do que nunca, porque tenho de ser um exemplo para a minha filha, não posso querer que ela seja no futuro uma pessoa emocionalmente forte, com autoestima, com amor próprio, se a própria mãe tantas vezes e de forma tão subtil disse "não" a si mesma e sim para os outros. Estou, agora sim, a começar a dizer SIM a mim mesma. Sem achar constantemente que há algo de errado em ser quem sou!

 

Tenho estado, mais do que nunca, na minha bolha. Alguns dias é-me difícil viver no mundo real, ter de lidar com assuntos mundanos ou aderir a conversas que no fundo não me interessam, só por pertença a grupos sociais, fazer coisas por obrigação. Claro que tenho de as fazer. Não sou uma ilha, não vivo sozinha, preciso funcionar em sociedade, preciso vestir essa persona todos os dias. Mas há dias em que isso me é mesmo muito difícil. Só queria ser essência o tempo todo, só queria ser, sem ser em esforço. Há dias em que só queria ficar em retiro durante um mês seguido! Não ter de lidar com a(s) realidade(s) externas enquanto reorganizo e reconstruo as minhas internas.

 

No outro dia, tive um dia energeticamente tão pesado que desabei a chorar mal cheguei a casa e nem sabia bem porquê, mas sabe tão bem chorar. E é tão necessário.

 

Estou a transmutar e a ressignificar mais coisas do que as que consigo alguma vez descrever por palavras. Poderia dizer tanto mais, mas fico-me por aqui por hoje. Faz-me bem escrever isto.

 

Em

"Mulheres que Correm com os Lobos" de Clarissa Pinkola Estes

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