Disclaimer: pensei duas vezes antes de partilhar aqui isto. O pensamento de "mas
o que vão pensar de mim?" dominou-me. Depois - e esta é a beleza de ganhar
consciência - apercebi-me de que estava a ter este pensamento limitativo e de
que seria mais um exemplo de como os nossos pensamentos limitativos nos limitam
a vida. Faz sentido para mim, hoje, partilhar isto e não me faz sentido nenhum
coibir-me de o fazer por puro medo de algo que não controlo de todo - o
que vão pensar de mim. Estas experiências fazem parte da minha vida e de
quem eu sou. Fazem, também, parte do meu caminho de crescimento e
desenvolvimento pessoal.
Por isso,
conscientemente, neste post, escolhi abandonar o "mas o que
quem ler isto vai pensar" ("os outros"), e decidi avançar na
mesma.
Porque,
realmente, e cada vez mais, o que os outros pensam me
interessa e me limita menos e menos. Ainda bem que finalmente consigo, aos 32
anos, pôr esse conceito em prática.
Além disso, a
exposição de algo na minha vida que até agora era secreto, me provoca uma
sensação assustadora de medo que estou disposta a enfrentar com coragem. Pois
um tema que tenho explorado bastante recentemente, é este, de nos expormos aos
nossos próprios medos.
----------------------------------------------------------------
A vida é,
realmente, cíclica.
E para pessoas
que sentem as coisas muito intensamente, tanto as boas são muito boas como as
más são bastante desconfortáveis.
Acredito que a
evolução acontece em ambos os cenários.
Como falei
num post anterior, pelo que me lembro de sentir (e
também pelo que sei que me esqueci, mas sei que vivi/senti), e pelo que me
contam, eu suspeito muito que tive uma depressão infantil. Sim, é
demasiado arriscado fazer este auto-diagnóstico acerca de algo que aconteceu há
tantos anos, mas eu tenho quase a certeza que sim.
E chegando à
adolescência, a tristeza continuava a ser o sentimento predominante, mas aí
algo aconteceu, quando entrei nos escoteiros, onde andei alguns anos e me fez
muito bem, foi quando me comecei a abrir para o mundo e arrisco mesmo a dizer,
a ser feliz.
Claro que tinha
as questões que qualquer adolescente tem, as crises existenciais que
começaram aí e nunca mais acabaram, mas não as encaro como algo negativo, bem
pelo contrário. Aí sim, comecei a aprender o que era felicidade,
ou o simplesmente estar bem, ou o não estar triste o tempo todo, como tinha
sido até aí.
Quando fiz
Erasmus, tudo mudou (para melhor).
E essa
foi uma das minhas muitas vidas que sinto que já vivi, que mais me marcou.
E foi no âmbito
desta experiência, que tive o primeiro contacto com o mundo das substâncias
psicotrópicas psicadélicas. E tive verdadeiros acessos de "Psychedelic breakthroughs".
Tinha 21 anos,
vivia pela primeira vez sozinha num sítio onde ninguém me conhecia e queria era
aproveitar ao máximo. Fui
frequentando meios e conhecendo pessoas e foram-me dadas a experimentar coisas.
Sim, claro que
cresci a ouvir dizer que todo e qualquer tipo de droga é mau, tudo para o mesmo
saco, se experimentas uma vez ficas agarrada para a vida. Mas nesta
altura já tinha alguma maturidade, muita capacidade de questionar o que me
diziam como verdade absoluta, e autonomia para me informar e fazer as minhas
escolhas e foi o que fiz.
Partilho agora
alguns textos que fiz aquando de algumas dessas experiências, no blog que
mantinha na altura, o I (Am)Sterdam (e sim,
agora que o revisitei e reli muitos dos textos que por lá pus, me deu uma
nostalgia!!! Dá para voltar atrás no tempo, por favoooor???)
"Descobri que o céu pode ser um local na terra.
Foi uma experiência tão intensa e maravilhosa. Os
pequenos animais, lagartos, plantas, flores, a crescer a partir do chão em
direcção a mim, como se eu pudesse andar entre eles... as cores dos cartazes e
postais na minha parede, com a luz das velas na fita-cola, dava a sensação que
um lençol de água, uma cascata colorida e calma, caía pela parede, era tão
bonito, tão tão LINDO, apetecia-me tocar, fundir-me na parede, abraçá-la para
sempre, sentir a água nas minhas mãos. Poderia ter ficado a olhar para aquele
espectáculo, para sempre. Encontrar padrões de imagens, sons, cores, que nunca
tinha encontrado antes. Encontrar coisas surpreendentes num quarto onde vivo há
quase 3 meses. Não foi assustador como eu pensava que seria, pelo contrário,
foi FASCINANTE.
As cores eram tão vívidas, conseguia distinguir as
mais pequenas nuances, as mais pequenas diferenças de contornos, quase parecia
ser um desenho animado com umas cores muito fortes mesmo; as sombras eram mais
evidentes, conseguia ver o degrade da intensidade das sombras, o seu gradiente,
na perfeição; os sons eram tão intensos, as músicas eram tão bonitas e felizes,
de uma felicidade que tocava na tristeza, e uma espécie de tristeza que se
confundia com a mais pura das felicidades. Fez-me chorar. Chorar de tanta
felicidade junta. E é tudo tão bonito e intenso… tão engraçado – rir durante
meia-hora seguida é perfeitamente possível! – que só apetece sentar e ficar a
olhar para toda aquela beleza à minha volta, só rodar a cabeça e ver coisas
diferentes, mágicas, até pozinhos coloridos no ar eu conseguia ver. Andar
também era uma experiência engraçada, como se tivesse molas nos pés e nos
joelhos, e conseguisse andar como num trampolim. Andava como se de um trampolim
o chão se tratasse (sem que nunca aqueles padrões do chão desaparecessem) a
tocar as paredes, a vê-las a mover de uma forma fascinante, a tocar em todos os
efeitos visuais, a tentar senti-los com as pontas dos dedos, com o meu corpo
todo.
E é tudo tão maravilhoso que dá a sensação que estou
em todo o lado deste maravilhoso mundo. Como se o meu corpo se tivesse tornado
em pó e fosse com o vento para todos os locais deste lindo planeta.
É como olhar o mundo com olhos diferentes. Aliás, não
apenas olhar, mas sim ver. Cada pormenor é tão bonito e intenso e perfeito.
Perguntas-te porque é que nunca antes tinhas visto o mundo assim, por que razão
não o podes ver sempre assim, porque é que esta não pode ser a tua realidade
constante, e porque é que, alguma vez na tua vida, te sentiste miserável, como
é possível, se neste momento estás tão feliz, de uma forma tão esmagadora que
cansa. Se neste momento, tão pequenino e tão eterno como é cada segundo que
passa, é tão bonito e tu nada mais queres senão apreciá-los na sua essência,
pelo que são, naquele momento, naquele local, naquela circunstância, cada
detalhe que encontras é tão bonito, é como descobrir todo um novo mundo pela
primeira vez, qual bebé que nem uma esponja. A beleza é tão imensa e
esmagadora, ao ponto de te fazer respirar mais rápido e mais fundo, sentires o
bater do teu coração e até tornares-te consciente do teu próprio corpo, para
teres a certeza que estás tão VIVA como sentes que estás, para teres a certeza
que estás mesmo aqui a presenciar isto tudo, que não é um sonho e que não, não
estás nas nuvens como crês estar. Rapidamente, porém, te apercebes que este
corpo, esta respiração, este bater de coração, não é mais teu. Ele pertence
agora ao universo, à terra, estás perfeitamente conectado com tudo o que te
rodeia, o teu ego desapareceu, não há uma noção definida do “eu” ou de um
“aqui” e muito menos de um “agora”. Tudo de repente se torna num Uno perfeito.
Um nível totalmente diferente de consciência.
No fim, quando os efeitos visuais passam, notas o
extremo cansaço e exaustão de te teres rido tanto, chorado tanto, amado tanto,
descoberto tanto, VIVIDO tanto e tão intensamente durante 4 ou 5 horas, e
começas a entrar na fase mais filosófica; já não vês lagartos e flores a
crescer do chão, mas começas mais a pensar no significado profundo que tem tudo
o que viste. E então tens a certeza que a tua vida e a tua perspectiva sobre as
coisas mudou. Para sempre.
Hoje acordei no quarto das maravilhas… tenho a
sensação de que tudo foi apenas um sonho maravilhoso, apesar de real. Tenho a
sensação de que, se perguntar às pessoas que partilharam esta experiência
comigo, elas vão dizer que eu sonhei tudo. Porque agora eu olho para o chão, e
já não consigo mais ver a diferença do gradiente de cores; as paredes já não
mexem; já não há cascatas coloridas a cair dos posters na parede. No entanto,
sinto que nunca mais vou esquecer esta experiência. Foi uma das experiências mais
fantásticas pelas quais já passei."
E mais tarde, transpus para outro blog
que tive, Em Estado Puro:
"Powerful.
Everyone could follow me, I
have an ocean made of lights on my feet, I have someone offering me a cigarette
on my mouth while I sit on the edge of the bed and write in this uncontrolled
and mad manner. The text is small, but the meaning is profound, and the letters
are big, and insane. He’s saying I must be writing the next bible.
“We are in a palace and we are
god”.
Powerful.
I feel like I own every piece
of knowledge. But its not a word-kind of knowledge, it’s a body-kind of
knowlegde. Like I have that knowledge craved in my body, I know all the answers
to all the questions in the world, in my body. It’s a wonderful feeling.
And also the emotions. They’re
all in me, I possess them all and I can rule when to feel what, so I have a
power.
-- // --
Lasers with warmth.
Rainbows in the shadows.
I keep thinking to myself,
normal people on normal vacation must not feel like this.
Hunger. Tireness.
One half of the room is red
but the other one is blue.
I can change the color of the
room just by turning my head.
I think that’s what I meant
when I said I had a power.
My body levitates.
The chandeleer is made out of
lava, in different colors swiming along the bright red."
Senti isto uma
e outra vez, e outra vez e outra vez. Estava de tal forma embrenhada nisto,
nesta wonderland, que era para passar lá um semestre e pedi o prolongamento
para 1 ano.
Não, claro que
não fazia isto todos os dias. Mas as experiências que tive fizeram surgir
todo um novo Eu, e queria muito continuar a explorar esse novo Eu. E
agradeço-me a mim mesma por tê-lo feito!
O meu point com
este post é: desde que tive estas experiências, que algo no
meu interior mudou radicalmente. Encontrei-me de uma outra forma, e aprendi a
saber onde procurar para me encontrar e para me conectar quando me sinto
perdida, sem ter de recorrer a nada físico. Hoje, este tipo de experiências já
não cabem no meu estilo de vida (embora não diga que um dia não venha a
repetir, mas nas circunstâncias atuais, não), no entanto, foi tipo uma
porta (ou várias) que abri e agora que já vi o que está para além, é como se
não conseguisse "desver". No fundo, isto deu-me ferramentas para a
vida.
Hoje em dia, e
por muito polémico que isto possa parecer, acredito que toda a gente deveria
ter pelo menos uma experiência deste tipo na vida. É verdadeiramente espiritual. Uma coisa que, inicialmente, era para ser
puramente recreacional, de repente tornava-se numa experiência quase sagrada.
E sim, claro,
depois disto tive outras "fases e processos e crises", como já disse
várias vezes são processos internos de evolução que nunca acabam,
eu comecei este blog precisamente para documentar as fases pelas quais vou
passando, agora, nos meus 30's. Mas o point é: ter
passado por isto criou uma espécie de "lugar" que ficou bem guardado
no meu interior e ao qual consigo aceder e me faz tão bem aceder a ele. Minha
nossa!!! Eu posso dizer que sou uma previligiada porque experimentei um tipo de
FELICIDADE e plenitude e conexão e as melhores sensações do
mundo que há algo dentro de mim que SABE que mesmo não sentindo isso todos os
dias, isso é POSSÍVEL porque eu já o senti.
Talvez a
expressão que melhor descreve é o "body-kind of knowledge". É
um ganho de consciência, uma expansão incrível nunca antes atingida, a nível da
mente que se espalha pelo corpo, e depois pelo planeta, e depois por
absolutamente tudo, porque nós passamos a ser esse tudo.. É como se,
simplesmente, soubéssemos. De repente, sabemos. De repente, sabemos tudo. E é
tudo tão simples, e tão maravilhoso, e sentimos uma gratidão tão profunda,
e é simplesmente aquele pensamento de "mas porque é que eu não me sinto
sempre assim, se é tão fácil sentir-me assim". Claro que, na realidade,
existem fases e momentos de m*rda na vida. Claro que temos de os aceitar,
porque fazem parte, não devemos lutar contra eles, devemos senti-los e
processá-los e deixá-los ir. O lembrar-me de que tive todas estas sensações e
conclusões sobre a vida ajuda-me a processar e deixar ir as sombras, quando
elas aparecem.
E isso é tão,
mas tão terapêutico!!! É tão transformacional, e é uma coisa que uma vez
vivida, nunca mais se esquece.
Uma frase que partilhei sobre a(s) minha(s)
experiências insanas, e que teve repercurssões positivas para o resto da minha
vida, ainda hoje a leio e ressoa em mim: "Eu sei que já senti e vivi tudo
aquilo, e portanto, sei que é possível sentir e viver tudo aquilo." Só o
saber que é possível, faz com que tenha um lugarzinho dentro de mim ao qual
consigo aceder facilmente, é aquilo a que eu chamo da minha wonderland.
É como os traumas, mas no modo reverso. Quando vivemos algo profundamente
negativo e marcante, isso fica guardado em nós, mesmo que o
"ultrapassemos", há sempre esse lugar mau dentro de nós. Com isto, é
a mesma lógica, mas com o bom. É como se fosse um trauma bom.
Às vezes, só de falar sobre essas experiências com
outras pessoas, me faz quase ter as mesmas sensações físicas. Aliás, só o estar
a escrever sobre isto e a reviver, já me arrepia, de uma forma muito boa,
mesmo! Digo e repito: ainda bem que o fiz e quem me dera que toda a gente
pudesse saber do que estou a falar!
Edit:
Sobre substâncias "espirituais", nunca
experimentei Ayahuasca, mas já ouvi falar muito! Não é algo
recreacional mas sim medicinal (apesar de algumas outras substâncias, como as
que referi acima, também serem, à partida, mais recreacionais, mas acabarem por
ter um efeito medicinal falando de saúde mental, e/ou espiritual), nem a
propósito da escrita deste post, ouvi dois episódios do
podcast Maus Hábitos sobre
este tema, que aqui deixo e cuja audição recomendo muito:
(Incrível, fiquei muito curiosa. Não era algo que
experimentasse na fase de vida em que estou agora, mas definitivamente vejo-me
a experimentar algures na minha vida futura! 😜)
Edit 2: Curiosamente,
e porque lá está, o universo parece que às vezes envia sinais... Depois de
escrever este post, e no dia seguinte ter ouvido estes dois
episódios (coincidentemente estavam no "play next" da lista), no
mesmo dia - e "por acaso" - atravessou-se no meu caminho uma
dissertação de mestrado sobre plantas medicinais utilizadas em contextos
terapêuticos e espirituais, o que abriu toda uma nova curiosidade para explorar
- a um nível teórico, por enquanto - todo um novo tema!
Sem comentários:
Enviar um comentário