domingo, 4 de agosto de 2024

Porquê ser resilientes, se podemos ser anti-frágeis

 

Ser resiliente é um conceito sobrevalorizado. Sempre tive esse feeling, mas nunca sabia explicar bem como.

    "Desistir é para os fracos!", "Tens de ser resiliente!", "Tens de ser persistente, mesmo quando algo está a ser muito difícil!", "Não existe sucesso sem resiliência", "Tens de", "Tens de", "Tens de (...) ou és fraca".

(Já para não falar dos repetitivos "tens de", "deves", "assim é que é correto" com os quais somos sempre impingidos, mesmo que no nosso íntimo saibamos que algo não faz o menor sentido!)

    E essa ideia é reforçada constantemente e acaba por fazer eco "Tens de, senão és fraca". "Não ser resiliente é ser fraco".

    Esse é o conceito predominante.

    Mas, e se olharmos para isso com outra perspetiva? A perspetiva que eu sempre olhei, mas que nunca tinha, realmente, encontrado as palavras para descrever.

    No outro dia, tropecei, literalmente, neste conceito. E fui pesquisar mais. E descobri que era isto que se adequava mais à minha forma: ser anti-frágil.



O conceito surge do livro, escrito por Nassim Nicolas Taleb "Antifragile: Things That Gain From Disorder". Não li o livro, confesso. Mas li sobre o conceito e formei a minha própria interpretação (vale o que vale 😛 )

    À partida, ser anti-frágil é o mesmo que não ser fraco, o que nos remete novamente para a ideia de ser resiliente (sendo a resiliência o antagónico de fragilidade). 

    Mas não podia estar mais longe da verdade, o que só prova que esses chavões e frases feitas não passam disso mesmo. É auto-explicativo e nem preciso de aprofundar esse tema.

    O anti-frágil não é algo que resiste. É algo que se molda. E, nesse processo de se moldar, ele transforma-se para algo melhor, uma versão menos frágil de si mesma. O anti-frágil não quebra, como um material fixo, ele é flexível, como um material capaz de levar vários embates, saber dar-lhes a volta, e não recuperar a forma original, mas levar com novos embates, já tendo essa nova forma.

    Segundo a física, "Resiliência é a propriedade que alguns corpos apresentam de retornar à forma original após terem sido submetidos a uma deformação." Traduzindo para a linguagem corrente, ser resiliente seria levar com estímulos e experiências negativas, que causam sofrimento, angústia, tristeza, desconforto - entre muitas outras experiências humanas negativas e que causam ansiedade - e não se abalar.

    Anti-frágil é, portanto, um corpo, um conceito, que se vai moldando com o tempo. Nunca deixa de ser inteiro, mas nunca fica resignado a esses estímulos e experiências negativas. Ultrapasso-as e eleva-se a eles.



O paradoxo disto é que, em física, os materiais mais resistentes são os que são moldáveis. Então, porque insistimos em dizer que a resiliência é nunca quebrar? É nunca "desistir", é nunca mudar de rumo, é continuar a insistir mesmo quando não queremos, just for the sake of it.

    Não faz sentido absolutamente nenhum e se, durante muito tempo, me chicoteei por não ser "resiliente" o suficiente, hoje em dia consigo (e ainda bem) olhar para esta questão de uma forma bem diferente. Sou anti-frágil no sentido em que me moldo com as experiências e sei reconhecer quando elas já não me servem, já me moldaram o suficiente, e ser "resiliente" nelas significaria deixar que elas me quebrassem.

    E portanto, para mim, após reflexão longa sobre o assunto: a fragilidade é continuar a insistir em situações, coisas, circunstâncias, escolhas que podemos alterar e não o fazer porque estamos presos à ideia fixa de que temos de ser "resilientes". O ser anti-frágil é precisamente isso: sim, enfrentar essas coisas, sim, embater de frente com elas, sim, sofrer com elas, mas também sim, saber pôr um ponto final, alterá-las. E ao alterá-las, sair mais forte delas. E quando digo sair mais forte não é continuar no sofrimento auto-imposto só porque sim, mas sim, saber que para a próxima, já sabermos que aquilo não é para nós. No fundo, é não repetir os mesmos erros. 

O anti-frágil renova-se, o resiliente insiste até quebrar.

    Não ser frágil é saber ficar vulnerável perante determinada situação e beneficiar no crescimento que a vulnerabilidade nos traz, mas no fim, saber que aquela situação nos deixa vulnerável e não deixar que isso volte a acontecer porque já conhecemos aquela realidade, já sabemos como reagimos àquela realidade, já crescemos com ela, e portanto, haveremos de nos confrontar com outras realidades que nos causam sofrimento, desconforto e vulnerabilidade e então saberemos beneficiar da vulnerabilidade e do desconforto até ao ponto ótimo, saberemos ser anti-frágeis e saberemos o que fazer para sair delas até voltarem a aparecer com outra roupagem. (É como tudo... há um ponto que é o ótimo, a partir daí já é maléfico).

    Sim, é um ciclo. E é uma arte. Uma arte que estou a aprender a dominar.

    Para ser anti-frágil, é preciso experimentar. Experimentar e errar e perceber que não é aquilo e em vez de continuar a insistir, é experimentar algo novo e diferente outra vez. E outra vez, e outra vez. E as vezes que forem necessárias. Quando criamos situações de risco, situações novas, então podemos errar e aprender. Um dos "mandamentos" da anti-fragilidade é "focar mais em evitar o que não funciona do que em descobrir o que funciona". Para mim, essa ideia é fascinante. Porque cada coisa que começo, eu não faço ideia se é "a coisa que funciona para mim"; mas logo descubro se é ou não é e, se não for, o importante é focar em sair dela e evitar entrar de novo nela.

    Adorei aprofundar o conceito de anti-frágil e vou continuar a explorá-lo e aplicá-lo na minha vida e nas minhas vivências, porque faz sentido para mim.

E sobre a frase "Não existe sucesso sem resiliência"... Talvez o meu conceito de sucesso seja ser cada vez mais anti-frágil.

 

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