Eu sou uma pessoa
extremamente organizada. Quase obsessivamente organizada. Não gosto de caos,
não gosto do imprevisível, não gosto de coisas fora do sítio - embora saiba que
tudo isso faz parte da vida e tenha arranjado mecanismos para lidar com.
Sou
organizada com os planos do quotidiano: tenho tudo anotado numa agenda em papel
(mesmo old school) e complemento com o calendário no telemóvel e os
seus úteis reminders. Faço listas e listas e dá-me um gozo enorme,
não riscar (nunca riscar!) mas sim colocar um "check" quando completo
tal tarefa. Chego ao ponto de incluir, numa determinada lista, um item que já
completei, só para poder fazer o check naquele momento...
Tenho dossiers organizados por separadores e em cores, um para assuntos
pessoais, outro para assuntos profissionais ou de projetos. Se me pedirem algum
documento importante, eu sei escrupulosamente onde está. Nunca me esqueço de
levar um documento importante para onde é preciso, quando é preciso. As chaves
de casa estão sempre no mesmo lugar e nunca me aconteceu sair sem
elas. Tenho as pastas organizadas no PC por áreas, temas e
subtemas. Tenho, nos meus diversos emails, pastas com cores diferentes
para cada tema ou assunto. Tenho de limpar as caixas do spam e do lixo todos os
dias.
A obsessão do
"ser certinho" chega ao ponto de, por exemplo, só começar um novo
tema de escrita numa nova página de um caderno.
A
casa tem de estar sempre arrumada, as camas sempre feitas e a loiça suja sempre
na máquina. Não suporto desarrumação, desorganização, sujidade. As toalhas
sempre enroladas nos armários, cada caixa serve para o seu propósito.
Para me ajudar a manter esta tarefa de manter o caos longe da minha vida,
também prático o desapego. Detesto manter coisas que não têm qualquer
utilidade. Detesto ter caixas e bolsas a mais. Detesto ter bibelots em
cima dos móveis que acumulam pó. Detesto tapetes e cortinas. Gosto de tudo
liso. Móveis quase vazios. Superfícies fáceis de limpar. Loiça, só a que é
necessária. Prefiro ter de lavar um prato que está na máquina porque preciso de
o usar e já não tenho nenhum, do que ter 30 pratos no armário quando só preciso
de 3.
O
mesmo se aplica a coisas não palpáveis: por exemplo, detesto deixar
capítulos de livros a meio; tenho sempre de terminar aquele capítulo. Não gosto
de começar a ver uma série nova sem ter terminado a que estou a ver. Gosto de fins
antes de novos inícios. Apago tudo o que é mail que não interessa. Tudo o que
interessa, leva a etiqueta respectiva e segue para a caixa respectiva. Detesto
ter emails por ler. Assuntos por resolver. Preciso resolver as coisas, metê-las
em caixas, e muitas vezes atinjo isso através da escrita. Ajuda-me a organizar
o caos que é a minha mente.
Enfim,
sou completamente freak nestas cenas da organização e de ter
tudo a "fazer sentido na minha cabeça".
Mas
há uma coisa específica na qual eu simplesmente não consigo ser organizada. Já
tentei várias formas, várias estratégias e nunca consigo "stick to
it". Afinal, a exceção confirma a regra, não é?
E essa coisa é...
COMIDA. o raio da comida. As refeições. A planificação das refeições. E
isso irrita-me. Porque, ora vejamos, eu tenho todas estas regras e estes
rituais de organização e desapego, para simplificar a vida. Porque o caos me
deixa irritada e frustrada e com uma sensação de perda de controlo, eu aplico
todas aquelas coisas para que a vida siga mais simples e descomplicada -
embora, eu sei, pareça o contrário, para mim é o que funciona e eu gosto dessa
minha vertente. E eu queria ser assim com a comida porque eu detesto
ter de pensar todos os dias no que vou comer, pensar no que tenho de cozinhar.
I
fucking dread it.
Eu
sempre detestei cozinhar, sempre tive aversão a tudo o que tivesse a ver com a
planificação de refeições. Por isso, essencialmente só comia coisas
rápidas, de ir ao forno ou microondas, massa com atum, pão e bolachas e estava
a andar.
De
há uns 3 anos para cá, decidi que tinha de começar a comer de forma mais
saudável. E consegui. Mas aquele plano de fazer 2 sopas incrivelmente saudáveis
por semana e todos os dias um prato colorido diferente falhou redondamente. Não
tinha paciência para cozinhar tanto quanto o plano exigia por isso começava a
fazer panelões da mesma sopa e congelar que desse para comer 2 semanas até
enjoar e ter de me preocupar de novo.
Depois, achei que tendo uma Bimby ia resolver. E resolveu, em parte.
Ajuda a fazer pratos mais elaborados. E ajuda porque dá para planificar a
semana e criar listas de compras automáticas baseado no que decidimos
fazer essa semana. Mas consigo seguir esse plano? Epa, não. E o mais parvo é
que não sei explicar porquê mas sou incapaz de seguir os meus planos de
refeições. Tenho dezenas de receitas guardadas em pastas que criei na Bimby,
mas faço alguma? Raramente.
Esta necessidade de planificar as refeições acentuou-se com a vinda da
Lia. Quando chegou a altura da introdução alimentar, lá senti essa pressão.
Oferecer coisas diferentes saudáveis todos os dias. Começava sempre motivada
mas depois a desmotivação apoderava-se de mim! Quando ela foi para a creche,
foi um alívio! Só tinha de me preocupar com 2 refeições (pequeno almoço e
jantar), e não com 5 por dia. Depois veio o novo confinamento e lá voltou essa
pressão. Bom, decidida, mais uma vez, a contrariar essa minha falta de vontade
e planeamento na cozinha, fiz um plano. Uma lista de pratos saudáveis
acompanhada de uma lista de compras que eu sabia que tinha de comprar aquilo e
pronto. Era só fazer!
Só
que não! Comprava tudo de uma vez e depois não dava andamento, a fruta
apodrecia, tinha de deitar comida fora, ficavam restinhos aqui e ali (e a minha
mente freak de organização e desapego também detesta restos de
comida e pacotes meio cheios), os dias e as semanas iam passando e já dava por
mim a nem sequer olhar para o plano que orgulhosamente tinha construído e posto
no frigorífico com um íman todo bonito.
Simplesmente não consigo. Não consigo planificar refeições mas sobretudo
não consigo seguir as planificações que às vezes até faço. Por isso, o
que acontece é: para ela, todos os dias penso em algo no momento; excepto a
sopa, essa faço logo para todos os jantares (que alívio que foi o regresso à
creche, nesse aspecto!). Para mim: faço um ou dois pratos em quantidade massiva
para os meus almoços durante a semana. E sim, às vezes fico a comer a mesma
coisa 3, 4, 5 dias ao almoço, mas prefiro isso a ter de pensar, todos os dias
no que é que vou fazer para o dia a seguir. É fisicamente e psicologicamente
desgastante, gasta demasiado tempo e recursos.
O
homem cá de casa é responsável pelas compras e por fazer os jantares (menos uma
preocupação para mim), já que compras de supermercado é outra coisa que
dispenso completamente, e ele muitas vezes se queixa que não lhe digo tudo o
que é preciso comprar. E ele tem razão, causa frustração ele ir às compras e no
dia seguinte eu lembrar-me que afinal é preciso mais não sei o quê... Eu tento
lutar contra isso, mas esta minha fraqueza é difícil de contornar.
Eu
já tentei aplicar o meu gosto acentuado por organização, a esta área da minha
vida mas a verdade é que... I still fucking dread it and I can't stick to
it. O melhor é mesmo
aceitar essa realidade!
Se
eu tivesse possibilidades financeiras para tal, a minha prioridade máxima seria
contratar uma cozinheira ou alguém que pensasse nisso e fizesse isso por mim,
na totalidade. Se alguém se oferecer, eu aceito e delego na hora!
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